O lado mais sinistro do sistema bancário
De crise em crise, de susto em susto, de revelação em
revelação, vem à tona dia após dia o lado mais sinistro do sistema
bancário internacional.
Desde 2008, em que pese o esforço
midiático de concentrar fogo e visões em torno das “crises das dívidas
soberanas”, foi ficando evidente o quanto a desregulamentação do sistema
financeiro internacional custou aos cofres públicos das nações –
daquelas em crise aberta (como a Grécia) e daquelas que aparentemente
sobrenadam no dilúvio (caso da Alemanha). Naquelas sonhos coletivos e
individuais se transformam em pesadelos, enquanto direitos individuais e
coletivos se desmancham no ar ou às custas de cassetadas ou bombas de
gás lacrimogênio nas ruas.
Bilhões de euros são arrancados do
poder aquisitivo da população para impor uma “austeridade fiscal”
recessiva, depressora, depressiva e deprimento enquanto continua o
engorde das taxas de juro extorsivas cobradas para refinanciar a dívida
pública, que certamente não serão pagas por nenhum sistema bancário ou
financeiro, mas novamente pelas camadas mais frágeis da população, às
custas de arcarem com mais pesadelos. Nas que guardam algum resíduo de
organização e prosperidade – como a Alemanha – bilhões de euros foram e
são transferidos para bancos, oriundos de fundos públicos, quer dizer,
também do bolso de contribuintes e trabalhadores, para cobrir contas
abertas nacionais e internacionais.
Mas nos últimos dias mais
lados sinistros – e mais sinistros – vieram à tona. Semanas atrás foi o
caso da manipulação da taxa Libor da banca britânica, promovida pelos
representantes do banco Barclays na Associação de Bancos de Londres para
favorecer a obtenção e/ou a manutenção de clientes investidores. O
banco manipulava seus dados e induzia a manipulação da Libor por parte
das autoridades financeiras londrinas para baixo, para parecer mais
saudável do que era, a fim de manter clientes; ou inchava a taxa para
prometer melhor remuneração para atrair clientes em épocas de escassez. E
as autoridades – inclusive do Banco da Inglaterra engoliam as pílulas –
isso, pelo menos, de 2007 a 2010. Os prejuízos são incalculáveis, uma
vez que a taxa Libor, além de incidir pobre empréstimos entre bancos
britânicos, era uma referência mundial no setor.
Agora foi a vez
do HSBC. Uma investigação de mais de ano, feita pelo Senado
norte-americano, concluiu insofismavelmente que a seção norte-americana
do banco lavou dinheiro dos cartéis mexicanos de narcotráfico de 2002 a
2009, apesar dele ter sido advertido por agentes do fisco e até por
investigações internas de seus próprios funcionários.
Na
terça-feira isso redundou numa sessão humilhante para altos executivos
do banco, que renunciaram a seus cargos numa sessão pública do comitê do
Senado, embora negassem ter “conhecimento completo” das contravenções.
Já antes houve uma espécie de “mea culpa” por parte do banco perante um
comitê semelhante de autoridades britânicas do setor financeiro.
Além
disso, o banco (sempre a seção norte-americana) foi acusado por uma
série de outras contravenções, indo desde negócios ocultos com finanças
sírias e iranianas, à prestação de serviços para instituições
financeiras da Arábia Saudita e de Bangladesh suspeitas de terem
financiado em parte a Al Qaeda.
O Barclays já pagou 450 milhões
de libras em indenizações a clientes que se julgaram lesados. O Serviço
da Autoridade Financeira de Londres vai ser extinto e substituído por
outra agência, além de parte de suas atribuições passarem para o Banco
da Inglaterra. O HSBC promete uma revisão de seu sistema interno de
segurança.
A ver, para crer.
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.