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Spread bancário, taxa Selic e lucros


Por Adriano Almeida
Um fenômeno intrigante tem despertado polêmica entre diversos naipes de economistas; qual seja, no atual contexto de estabilidade inflacionária e aumento da demanda por crédito, os bancos modificaram seus portfólios de ativos, mas não vêm diminuindo o spread sobre empréstimos bancários na mesma velocidade da redução da Selic. Num trabalho elaborado em dez/06, defendi a hipótese de que em situação de volatilidade e incerteza quanto ao comportamento futuro dos dois preços-básicos da economia (câmbio e juros), os bancos decidem "racionalmente" embutir um spread de risco maior na taxa de empréstimo de modo a servir como precaução em caso de volatilidades bruscas nos contratos futuros de juros.


A incerteza quanto à evolução dos dois preços básicos (câmbio e juros), após as constantes crises externas da segunda metade da década de 90 até ao início do atual século, desorganizou o estado de convenção e criou mecanismos defensivos de comportamento. Com a instabilidade temporal dos contratos de crédito e a incerteza em ralação às taxas futuras de juros (mais precisamente o juro do swap de 360 dias) os bancos "racionalmente" reduziram os itens dos ativos de menor liquidez e maior risco temporal, como os empréstimos, e se voltaram para os títulos públicos de liquidez imediata e menor risco, usando-os como lastro seguro de seus passivos de curto prazo.


Entretanto, no governo Lula, a recuperação das exportações e a enxurrada de dólares especulativos aportados no país permitiram ao BC criar uma confortável reserva de dólar (hoje já ultrapassa os US$ 160 bilhões). Com câmbio mais estável, a Selic caiu de 26,50% ao ano, no início de 2003, para 11,50% em junho de 2007. Ora, com a estabilização das expectativas futuras de inflação, juros e câmbio, a única justificativa para manter o spread elevado é a de tentar conservar em altíssimo nível a rentabilidade sobre o patrimônio líquido. Na tabela 01, nota-se a desproporção gigantesca entre a Selic e as taxas de juros em diversas modalidades de créditos. Uma pessoa, p.ex., que financia R$ 10 mil na compra de um carro, paga só de juros o equivalente a quase a metade do valor do empréstimo.


Tabela 01: Despesas de Juros, em junho de 2007. Selic em 11,50%

Modalidades

Crediário**

Crédito pessoal*

Cheque especial

Financiamento de veículos

Juros médios, em %

55,3%

52,3%

139,7%

29,4%

Prazo médio, em dias

207

433

21

562

Juros pagos em empréstimos de R$ 10 mil

R$ 8.790

R$ 6.470

R$ 516

R$ 4.870

Fonte: BC (Elaboração própria). * Não inclui o crédito consignado. ** Financiamento para compra de bens, com exceção de veículos.


Ao manter o spread bancário elevadíssimo, os bancos estão lançando mão da estratégia de compensação entre a receita de tesouraria e a de crédito. Ao mesmo tempo em que o grau de importância da receita de tesouraria vem decrescendo com a queda da Selic, os bancos estão mantendo os spreads elevados para assegurar em alto nível a rentabilidade e o atrativo de suas ações negociadas na bolsa. Não é à toa que os bancos mantiveram em alto patamar a lucratividade no primeiro semestre de 2007. No levantamento dos lucros das empresas listadas na bolsa no primeiro semestre de 2007 realizado pela Economática, o setor bancário aparece como o setor mais lucrativo. O setor bancário, representado por 24 instituições, teve um lucro R$ 14,522 bilhões, equivalente a 22,5% do total dos lucros das empresas de capital aberto (tabela 02).    


Tabela 02: Os maiores lucros líquidos de setores de capital aberto, em R$ bilhões.

N0 empresas.

Setores

Lucro Líquido (primeiro semestre de 2007)

24

Bancos

14.522

07

Petróleo e Gás

11.398

06

Mineração

10.996

39

Energia Elétrica

7.814

319

Total

64.616

Fonte dos dados: Economática.


Por fim, resta ainda uma dúvida: será que a recente turbulência financeira irá reverter o atual cenário econômico do país e do sistema bancário? Sendo o real (R$) uma moeda inconversível e a pauta de exportação brasileira muito concentrada em commodities, as crises externas são fantasmas reais. O grande medo dos bancos é que as incertezas externas provoquem flutuações bruscas nas taxas de captação e de empréstimos tornando o spread bancário negativo. Não é à toa que o economista do Bradesco sugeriu que interrompessem a trajetória de queda da Selic. Mas o temor exagerado não se justifica, pois, além de o país estar com uma pujante reserva de moeda forte, os bancos centrais dos países ricos já estão irrigando o mercado financeiro com liquidez barata. De qualquer forma, entretanto, a atual crise financeira é muito pulverizada entre milhares de fundos de diversos tipos, que já estavam muito alavancados, de modo que não há como fazer qualquer previsão segura sobre os desdobramentos futuros da crise.

Adriano Almeida - técnico do Dieese/Bancários (BA)
   

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