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CUT-24 anos: central apóia entulho da ''era FHC''


Por Osvaldo Bertolino
As polêmicas no Fórum Nacional do Trabalho (FNT) pareciam intermináveis. No fundo, elas refletiam as contradições irreconciliáveis dos principais temas que estavam em discussão. A CUT apoiou iniciativas do governo que causariam grandes confusões no meio sindical. O resultado foi um tremendo fiasco da proposta de "reforma" sindical enviada pelo governo Lula ao Congresso Nacional - que ressucitava um dos entulhos da ''era FHC''. 





A pressa do governo e das duas principais centrais sindicais - CUT e Força Sindical - em aprovar as "reformas" sindical e trabalhista contrastava com a serenidade do presidente da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha (PT-SP). Segundo ele, era necessário ''dar tranquilidade'' aos trabalhadores em um momento de ''crise econômica aguda''. João Paulo disse que era preciso ''prudência'' e ''cuidado'' para não comprometer a legislação trabalhista, que demandaria muita discussão e estudo.




As reservas do presidente da Câmara dos Deputados eram bem fundamentadas. ''A minha opinião é que a gente não deveria fazer as 'reformas' em 2004 e sim deixar para 2005, inclusive dando tranqüilidade aos trabalhadores que estão amparados pela legislação atual em um momento de crise econômica aguda'', afirmou ele. ''É uma coisa prudente, a gente tem que tomar cuidado para não comprometer'', disse. ''A reforma trabalhista tratará de uma lei de 60 anos e vai exigir um aprofundamento muito grande, estudo de legislações comparadas, não é uma coisa simples, que você faz rapidamente'', acrescentou.




Cálculo de Bargas na posse de Berzoini




O ministro do Trabalho, Jaques Wagner, disse que não entraria na "briga''. ''Estou fazendo o Fórum andar. A agenda do Congresso não sou eu quem faz. Não vou entrar nessa briga, mas tudo passará pelo Congresso'', disse ele. E acrescentou que a decisão final do governo seria dada pelo presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva.




No início de 2004, Wagner seria substituído no cargo por Ricardo Berzoini - que iniciara o governo como ministro da Previdência Social. Assim que assumiu, o novo ministro disse que pretendia acelerar o processo de discussão das "reformas" sindical e trabalhista. Berzoini prometeu enviar ao Congresso Nacional a proposta de "reforma" sindical até o final de março de 2004. A trabalhista, somente em 2005.




Na posse de Berzoini, o secretário de Relações do Trabalho e coordenador do Fórum Nacional do Trabalho (FNT), Osvaldo Bargas, calculou que até o dia 17 de fevereiro de 2004 um relatório sobre o assunto seria entregue ao presidente Lula. Segundo Bargas, entre os principais pontos em que já existia consenso na "reforma" sindical estariam: o fim do imposto sindical, que daria lugar a uma contribuição negocial; e a "flexibilização" da unicidade sindical, obrigando todos os sindicatos a comprovarem uma determinada quantidade de sócios para manterem o direito à representação de uma categoria.




Revolução no movimento sindical




No dia 29 de janeiro de 2004, o FNT anunciou a primeira proposta que seria encaminhada ao presidente Lula. O dissídio coletivo e a data base para negociação seriam extintos. As regras do direito de greve também seriam alteradas. ''Estamos adotando o modelo da Organização Internacional do Trabalho (OIT)'', explicou Bargas. Com as mudanças, acabaria a possibilidade de julgamento de greves pela Justiça do Trabalho. ''Ninguém poderá dizer mais que uma greve é abusiva'', afirmou ele.




O presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, o Paulinho, que havia assumido a coordenação da bancada dos trabalhadores no FNT, disse que "os mecanismos de negociação passariam a ser fortíssimos - será quase obrigatório haver negociação''. O segundo relatório ficou pronto no dia 16 de março de 2004. Segundo o texto, o imposto sindical acabaria gradualmente. As centrais sindicais seriam legalizadas e novas regras para a unicidade sindical seriam instituídas.




Para a CUT, o trabalhador ganharia com a nova estrutura sindical. ''Quem vai ganhar com a reforma sindical é o trabalhador, pois os sindicatos, as federações, as confederações e as centrais sindicais serão mais representativas'', afirmou João Felício, secretário-geral da central. Para ele, se o que fora acertado no FNT fosse aprovado pelo Congresso Nacional, seria "o início de uma revolução no movimento sindical''. Felício disse que o fato de a central ter mais poder de negociação não significava que ela podia ignorar a base de trabalhadores. ''Se a central quiser negociar em nome da base, terá de ouvi-la'', explicou.




Nata das centrais contra declaração de Lula




No início de fevereiro de 2004, Lula disse num jantar com jornalistas da ''grande imprensa'' que o único ponto que não seria negociado na "reforma" trabalhista seria o direito a férias. O restante, inclusive a multa de 40% do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), poderia ser revisto. ''As declarações foram graves'', disse Paulinho. ''Muitas pessoas não diferenciam a reforma sindical da trabalhista e podem achar que estamos negociando direitos aqui'', acrescentou.




A CUT, a CGT e a Força Sindical protocolaram no Palácio do Planalto uma nota conjunta em que manifestaram ''estranheza e preocupação'' com relação às declarações de Lula. Bargas telefonou para o presidente e pediu a ele que "tranqüilizasse" os líderes sindicais. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) também divulgou nota alertando que a multa do FGTS não poderia ser extinta enquanto não fosse regulamentado o dispositivo constitucional que prevê uma indenização para compensar demissão sem justa causa.




A CUT manifesta-se contra a Portaria nº 160




De polêmica em polêmica, o FNT caminhava para uma crise cada vez mais profunda. Em outubro de 2004, a Força Sindical, a CGT e a SDS anunciaram em nota oficial que suspenderiam a participação no Fórum. A decisão foi tomada em reação à portaria nº 160, editada pelo Ministério do Trabalho em abril, que impedia os sindicatos de cobrar taxas confederativa e assistencial de não-sindicalizados.




A portaria nº 160 foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). No lugar, o governo editou a portaria nº 180 - resultado de um acordo do Ministério do Trabalho com as centrais pelo qual até maio de 2005 os sindicatos não fariam cobranças "abusivas" nessas taxas. Mas a Justiça Federal, a pedido do Ministério Público Federal, voltou a impedir a cobrança das taxas. ''O governo quer enfraquecer o movimento sindical para depois fazer a reforma trabalhista sem resistência dos sindicatos'', disse Paulinho.




De imediato, a CUT se posicionou contra a Portaria n° 160. "Entendemos que ao invés de tratar apenas da fiscalização de eventuais abusos cometidos por alguns sindicatos, o Ministério do Trabalho acabou por estabelecer uma confusão entre contribuição confederativa e contribuição assistencial ou negocial, partindo de precedentes e enunciados que ainda estão sendo discutidos judicialmente", disse em nota oficial Artur Henrique da Silva Santos, então secretário-geral da central. O governo recuou e as três centrais dissidentes voltaram a participar do FNT.




Plenária da CUT aprova ''plataforma democrática''




No dia 1° de fevereiro de 2005, Berzoini disse que a proposta de "reforma" sindical seria enviada pelo governo ao Congresso Nacional no dia 2 de março na forma de Proposta de Emenda Constitucional, a PEC-369 - em conjunto com um projeto de lei. ''O Fórum aprovou conceitos gerais. Houve muita polêmica na redação da emenda constitucional e do projeto de lei'', afirmou o ministro. ''Houve consenso na maioria dos pontos discutidos. A organização no local de trabalho foi o tema de maior resistência por parte dos empresários'', disse Bargas. ''Seria um desastre para o presidente Lula terminar o mandato sem fazer a reforma sindical'', afirmou Marinho.




A proposta de "reforma" sindical de fato foi encaminhada ao Congresso Nacional no começo de março. Mas, na prática, ela estava inviabilizada. O sistema confederativo, arbitrariamente excluído do FNT, havia organizado o Fórum Sindical dos Trabalhadores (FST) - que teve importante papel na crítica à proposta de "reforma". Defendendo a manutenção da unicidade, da contribuição sindical e do poder normativo da Justiça do Trabalho, o FST demonstrou capacidade de mobilização e forte influência sobre as bancadas parlamentares.




Na CUT, a proposta foi aprovada por apenas um voto de diferença - 13 a 12. Essa pressão se refletiu na surpreendente aprovação da ''plataforma democrática'' na 11ª plenária da CUT, no dia 12 de maio de 2004, pela qual a Articulação Sindical foi obrigada a aceitar a unicidade e outras significativas mudanças no conteúdo da PEC-369. A ''plataforma democrática'' era uma orientação que a central deveria seguir nos debates que ocorreriam no Congresso Nacional.




Congresso recebe proposta com reservas




A proposta foi idealizada pela Corrente Sindical Classista (CSC) e obteve o apoio da Articulação Sindical e da CUT Socialista e Democrática (CSD). O vice-presidente da CUT e membro da coordenação nacional da CSC, Wagner Gomes, destacou que a aprovação da ''plataforma democrática'' correspondia aos "objetivos de quem luta por uma reforma democrática voltada para o fortalecimento do movimento sindical". Fora do debate, os setores "esquerdistas" da CUT aproveitaram a confusão para deixar a central e criar a Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas). O patronato também aproveitou a situação para exigir a imediata negociação da "reforma" trabalhista.




No Congresso Nacional, a proposta foi recebida com reservas. A eclosão da crise política enterrou de vez a "reforma" sindical. "A discussão da reforma não tem prazo para ser retomada, está parada'', disse o deputado federal Vicente Paula da Silva, o Vicentinho (PT-SP), ex-presidente da CUT, logo após os primeiros ataques pesados da direita contra o governo Lula. Terminou assim a mais longa tentativa de implosão da legislação sindical e trabalhista - uma proposta dos economistas neoliberais que povoou a "era FHC", apoiada em alguns aspectos por integrantes da Articulação Sindical, e ressucitada pelo governo Lula. Falo do assunto na próxima coluna. 



Osvaldo Bertolino, Jornalista

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