Logo

Venezuela no Mercosul: entre o bate-boca e a diplomacia

Problema central do ingresso da Venezuela no Mercosul não está nas disputas verbais, mas na adaptação às normas do bloco. Diplomatas trabalham para superar assimetrias regionais, principal obstáculo ao processo de integração. Chávez diz que nada o fará brigar com Lula.


Marco Aurélio Weissheimer - Carta Maior

O debate central sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul não é a polêmica estabelecida entre o presidente Hugo Chávez e parlamentares opositores no Brasil e na Venezuela, mas sim os passos que o país deve dar para se adaptar às normas do bloco. A avaliação é do presidente do Parlamento do Mercosul, o deputado uruguaio Roberto Conde. Em entrevista à agência italiana ANSA, Conde disse que os membros plenos do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai) têm uma série de questões pendentes com o governo venezuelano, que podem resultar em uma redefinição de prazos para definir salvaguardas ou possíveis cláusulas de exceção.

Segundo ele, está em curso um processo normal de discussão política e econômica que "de forma alguma pode frustrar o processo de adesão da Venezuela". A preocupação central da Venezuela é que vários setores produtivos do país estão em desvantagem em relação, principalmente, às economias do Brasil e da Argentina, as duas mais fortes do Mercosul.

O presidente da Comissão de Representantes do Mercosul, Carlos Alvarez, também minimizou o bate-boca político em torno do caso, dizendo que as diferenças e declarações ásperas fazem parte de todo processo de integração. Alvarez defendeu o ingresso da Venezuela no Mercosul, destacando que "será agregado um país com extraordinárias reservas de petróleo beneficiando a integração energética do continente".

Quanto às divergências, ele lembrou a boa relação existente entre os presidentes da região, manifestando confiança na superação dos problemas. Por trás da esgrima verbal, que acaba ganhando maior destaque na mídia, os diplomatas dos países envolvidos trabalham diariamente para superar os problemas econômicos da integração, problemas bem mais complexos, pois envolvem uma série de assimetrias entre os países da região.

O movimento dos EUA
No Brasil, lideranças do PSDB e do DEM, principais partidos de oposição, manifestaram-se contrariamente ao ingresso da Venezuela no Mercosul após o episódio da não-renovação da concessão pública da RCTV. Durante um seminário na Colômbia, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse que "o Mercosul precipitou-se ao aceitar o ingresso da Venezuela como membro-pleno". FHC mencionou o critério das "cláusulas democráticas" para questionar esse ingresso.

Na mesma direção, o subsecretário de Estado dos EUA, Nicholas Burns, disse, durante recente visita ao Brasil, que o governo venezuelano patrocina uma "política do medo", que seria incompatível com a dos demais países da região. Burns condicionou um acordo entre EUA e Mercosul a uma prévia exclusão de Venezuela.

"Ninguém me fará brigar com Lula", diz Chávez
O governo dos EUA vem tentando aproveitar as recentes disputas verbais entre os governos de Brasil e Venezuela para recuperar algum espaço político mais consistente no debate sobre a integração regional. Nesta segunda-feira, o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, criticou esse movimento e elogiou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "De todas as partes do mundo fazem de tudo para afastar o Brasil da Venezuela, mas Lula é um amigo, um bom homem, um ser humano nobre, tem boas intenções, é inteligente, tem coragem", declarou Chávez. E acrescentou:

"Há um plano do império americano, que utilizando quintas-colunas na Venezuela e no Brasil, quer nos fazer brigar, mas ele (Lula) disse que nada o fará brigar com Hugo Chávez, e repito aqui: ninguém me fará brigar com Lula Pelo contrário, estamos à procura de soluções para os problemas que se apresentam diariamente".

O processo de ingresso da Venezuela no Mercosul está parado no Congresso brasileiro, mas não é exatamente por um problema político. Em março, o Palácio do Planalto enviou ao Congresso a mensagem de adesão. Esta deveria ter sido encaminhada à Comissão Conjunta do Mercosul. O problema é que essa comissão foi extinta quando da criação do Parlamento do Mercosul, por uma exigência regimental. Assim, a mensagem de adesão acabou caindo em um vácuo institucional. Até hoje, não foi lida em nenhuma comissão do Congresso.

Segundo o vice-presidente do Parlamento do Mercosul, Dr. Rosinha (PT-PR), essa é a principal razão objetiva para a lentidão do processo no Congresso brasileiro. Os problemas políticos existem, mas até agora se resumiram a manifestações acaloradas de parlamentares da oposição. Apenas os congressos do Brasil e do Paraguai ainda não aprovaram o ingresso da Venezuela no bloco. Uruguai, Argentina e a própria Venezuela já aprovaram. A oficialização da adesão só ocorrerá depois que os parlamentos de todos os países-membro aprovarem a medida.

Apoio dos movimentos sociais
No dia 12 de julho, movimentos e organizações sociais da Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e Venezuela, pertencentes à Aliança Social Continental, divulgaram nota fazendo um chamado aos governos destes países para que maximizem seus esforços visando a plena integração da Venezuela ao Mercosul. "Consideramos que este passo é vital para fortalecer a integração entre nossos povos, sabendo que este caminho é a garantia de e para os povos do Sul. No caso da incorporação ou inclusão da Venezuela ao Mercosul, é necessário destacar o caráter estratégico desta integração, que consolida a relação dos povos amazônicos do Brasil e da Venezuela. O Mercosul ganha uma perspectiva caribenha em direção ao amplo litoral atlântico, o que significa importantes impactos políticos, sociais e econômicos para nossos povos", diz o documento.

Alem disso, a Aliança Social Continental alertou "contra as manobras de forças opostas à integração, que querem prejudicar o Mercosul e quaisquer outras estratégias de integração soberana para a América Latina". "Estas forças são as que insistem em ressuscitar a Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) e que defendem a estratégia de integração subordinada aos EUA", advertiu a organização.

Template Design © Joomla Templates | GavickPro. All rights reserved.